Músicas de Raphael

domingo, 18 de abril de 2010

Sonho C.A.B.

Depois de curvas fechadas e contrárias, carros antigos e inexistentes, ruas estranhas e mal recordadas, eu digo adeus a meu amigo, e entro com uma mochila em minhas costas. Nenhum vigia, nenhuma saudação. Não sei se estou retornando, ou se sempre estive aqui.
O céu está nublado, o campo está vazio, os prédios desgastados, e o chão despedaçado. O vento sufocou as correrias e a incompetência arruinou a determinação. O pau-brasil se desvaneceu. A sombra e o orgulho se misturaram e se transformaram em uma decepção maior que a própria lembrança.

Agacho-me, deixo a ponta dos meus dedos correrem pela a areia espalhada na calçada, procurando um sentimento que esqueci aqui há muitos anos, um boneco que enterrei e jamais reencontrei. O que me sobra é uma reminiscência sem sentido. Só.

Cada sonho apaga mais, cada pesadelo assusta mais. É meio-dia e não tenho onde me sentar. Os pulos, os risos, pandeiros, o descaso e a ilusão da eternidade. Quem me guiará?
O pomar dissipado dá lugar a muros de cimento, que cortam cotovelos, arranham cabeças, e apertam corações. Não lembro nem o que existiu ali, mas me restam a cicatriz no joelho e as latas amassadas.

O resto está longe, inalcançável, irreparável, inaceitável, indistinguível, inalterável, indisponível, indiscutível.

Penso em ir à piscina, à quadra, mas tenho medo de não achá-los. Já me são vagas as manhãs, as toucas, as quedas, os jogos, a indisposição e a ansiedade. Quero correr, mas minha mente não entende. Frustração e indignação invadem meus olhos cerrados.

Quem vos deu o direito de vender minhas memórias, de bulir meu saudosismo, de alterar a amplitude das minhas verdades ?

Eu nunca quis voltar, e hoje não posso mais sair. Tento encontrar, manifestar, reassumir, cantarolar, mas sei que é algo que há de me seguir até mesmo depois que o inverno revés chegue, e continuará a me assombrar com suas loucuras pitorescas até mesmo depois de meus dias acabarem. Não quero sair, mas queria poder voltar. Pra sempre sentado naquela sala, mergulhado em risadas alheias, submerso em lágrimas fáceis, batucando o barulho incessante, admirando o idealismo velho e bonito de quem me ensina, sem saber que amanhã é muito mais que um novo dia, e que ontem foi muito mais que um adormecer. 

Sou um uirapuru atrasado, já não tenho mais a quem silenciar.